segunda-feira, 5 de outubro de 2009


Avaliar, questionar, compreender, entender. Mover aquela sujeira embaixo do tapete em dia de faxina é descobrir que a limpeza em que se vivia não era mais que uma ilusão. E ilusão é a palavra que apareceu estampada em sua testa hoje cedo. Iludida, ela acendeu a lâmpada para clarear o quarto já iluminado pelos raios de sol. Um tanto faz sem fim tomou conta da pobre moça iludida que acordou nesta manhã diante dessa minha perspectiva: Sentada em sua janela a observá-la.

Tanto fez trocar as meias, prender o cabelo sem pentear, lavar o rosto sem remover a maquiagem que ela nem fez questão de tirar na noite anterior. Tanto fez não colocar brincos, vestir a blusa amarrotada e não arrumar sua cama. Ela já ia saindo do quarto com a bolsa repleta de "tanto-faz" quando uma parada involuntária do seu corpo a faz travar-se ao chão. Ela dá exatos três passos para trás e se vê diante de um porta-retrato. Ela viu um rosto com um imenso sorriso. Ela podia negar o fato de ter se incomodado com aquele rosto tão seu, mas seus olhos fitaram aquele sorriso com ardor. E com sua dor.


E eu fiquei ali, no mesmo canto da janela, a observá-la. Ela inclinou seu olhar para o chão, deu três passos para frente e abriu a porta. Ela saiu do quarto e seguiu para o trabalho. Virei-me para o outro lado da janela, de maneira em que consegui observá-la andando em direção ao portão, ao carro, à solidão.


Daí eu comecei a avaliar, questionar, compreender, entender. E ainda assim é um pouco confuso para mim, que lido com essa menina tão de perto, vê-la partindo apática em dias cinzas, num sorriso tão errôneo, num brilhar tão desfocado, numa emoção tão contida, num sonhar tão acordado. É difícil não poder seguir seu rumo, lhe fazer companhia e ter que aceitar a condição dela me deixar ali, presa com um sorriso no retrato.


O retrato que fotografou sua ilusão.